- Escrito por Ankitha Gattupalli | Traduzido por Camilla Ghisleni
- há 6 horas
Os materiais de construção mais primitivos do mundo estão sendo usados para criar os edifícios mais avançados. À luz das crises ambientais, os arquitetos estão concentrando seus esforços em projetar ambientes melhores para as pessoas e o planeta. Os resultados podem muitas vezes parecer “greenwashing”, deixando de abordar a raiz do dano ecológico. A arquitetura ambientalmente responsável deve ter como objetivo não reverter os efeitos da crise ecológica, mas instigar uma revolução nos edifícios e na forma como os habitamos. Ensaios do livro The Art of Earth Architecture: Past, Present, Future preveem uma mudança que será um salto filosófico, moral, tecnológico e político para um futuro de resiliência ambiental.
A indústria da construção parece ainda estar presa no passado altamente dependente da inovação da era industrial. Muitas vezes, sob o pretexto da racionalidade, os materiais de construção industrializados continuam sendo usados de forma excessiva, levando a sociedade a avançar em direção às mudanças climáticas. A fabricação de materiais industriais é um agente de poluição ambiental. Alguns materiais, mesmo se comercializados como sustentáveis, requerem muita energia para serem criados ou mantidos. A produção de resíduos também pode variar entre os materiais de construção, cujo impacto ambiental pode ser substancial.
A saúde pública também é ameaçada pelos materiais industriais e seus processos de fabricação. Mesmo materiais ‘naturais’ podem ser inerentemente inseguros. O amianto, um mineral que surge naturalmente e um carcinógeno identificado, tem sido responsável pela morte de milhares de pessoas em todo o mundo. Os materiais de construção podem afetar a saúde durante várias fases do ciclo de vida do edifício – desde a fabricação e ocupação até a demolição e descarte. Infelizmente, a maioria dos produtos de construção compostos por elementos químicos nocivos são baratos, flexíveis e fáceis de aplicar e manter. A indústria é fortemente subsidiada, sustentando assim o uso de tais materiais.
O imposto sob o carbono exigido ao setor de construção visa persuadir financeiramente os construtores a se afastarem do uso de materiais convencionais prejudiciais. Embora haja méritos nessa abordagem, permanece a necessidade urgente de promover materiais de construção mais naturais e ecológicos, em vez daqueles que causam mais poluição e afetam a saúde pública. O que a indústria da construção – e a sociedade em geral – exige é uma mudança social e econômica que priorize o planeta.
No livro, Eco-Economy: Building an Economy for the Earth, o analista ambiental Lester R. Brown destaca a necessidade de projetar “uma nova economia de materiais” usando tecnologias existentes em materiais naturais como terra, palha, bambu e madeira. “O socialismo entrou em colapso porque não permitiu que os preços ditassem a verdade econômica. O capitalismo pode entrar em colapso porque não permite que os preços digam a verdade ecológica”, afirma.
Rumo ao Capitalismo Verde
O capitalismo verde, ou eco-capitalismo, reconhece que o capital e os lucros são igualmente dependentes da proteção ambiental e da sustentabilidade. A indústria da construção pode abrir caminho para o capitalismo verde adotando modelos que colocam as pessoas e o planeta ao lado do lucro. O uso de materiais ecológicos tem um efeito cascata no projeto de edifícios e cidades, abordando questões ambientais em escala unitária. Alcançar todos os benefícios da arquitetura verde juntamente com funcionalidade e lucratividade, no entanto, requer um forte nível de integração de design.
Os materiais sustentáveis também têm um papel crucial na missão do Painel Intergovernamental das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (IPCC) de reduzir as emissões globais de CO2. Os materiais de origem natural não requerem métodos de fabricação com uso intensivo de energia, ao contrário dos produzidos industrialmente. Suas emissões de carbono insignificantes ajudam a controlar o consumo de energia, desenvolver energias renováveis e construir economias circulares locais.
Para uma mudança em direção ao capitalismo verde, é necessária uma compreensão profunda dos materiais naturais, especialmente em seus contextos locais. Novos materiais estão sendo complementados pela redescoberta de antigos como terra batida, fardos de palha, bambu e pedra – todos não tóxicos, seguros, duráveis e versáteis. Paralelamente, a habilidade ancestral de gerações de construtores precisa ser reexaminada para fornecer uma base para práticas de construção vernaculares modernizadas.
Rumo a uma Economia Circular
Edificação circular é uma palavra da moda – todo produtor de material hoje em dia afirma ser circular. No entanto, na prática, as taxas de reciclagem em todo o mundo estão abaixo de 9%, sem material secundário suficiente para atender à demanda. Uma economia circular redefine a forma como o mundo consome e produz bens e serviços. É uma estrutura econômica, mas também social, que busca uma mudança do consumo de recursos finitos e procura eliminar o desperdício e a poluição. A transição para a arquitetura natural assumiu o centro das conversas, enfatizando a reutilização, reparo e reciclagem de materiais.
Os desafios ambientais estão estimulando a pesquisa sobre o uso de recursos coletados localmente e a sustentabilidade para incentivar a reutilização e reciclagem de materiais. A economia de energia inerente e as práticas respeitosas da arquitetura natural também podem ser hibridizadas usando a tecnologia para otimizar as propriedades do material. O potencial da última geração de materiais de construção com base biológica impulsionará a transição para um ambiente construído neutro em carbono, saudável e circular.
As sociedades precisam preservar e fortalecer as culturas arquitetônicas locais e promover uma gama diversificada de soluções construtivas que podem ser usadas em vários contextos e escalas. Isso requer uma revisão do nosso modelo econômico e social, revendo a relação entre os seres humanos e seu meio ambiente. Os materiais naturais exigem não só uma forma ecológica de construir, mas também uma nova forma de viver.
Rumo a uma Mudança de Paradigma Social
O ethos atual da arquitetura “verde” é limitado, manifestando-se como tentativas tecnológicas para melhorar a eficiência energética de um edifício. Esse paradigma social, especialmente na arquitetura, parece fixado no movimento modernista que construiu estruturas descontextualizadas e descoladas do meio ambiente. A antiga harmonia entre os humanos e a natureza continua sendo uma relíquia do passado, quando poderia se direcionar à uma mudança social para um mundo ecologicamente equilibrado.
Uma visão coerente para o futuro da civilização orienta pensadores como o “arquiteto da terra” Romain Anger, e a arquitetura verde desempenha um papel importante nisso. A tensão enfatiza a necessidade de retornar às nossas antigas visões de mundo como um todo integrado na biosfera. “Os edifícios do futuro devem ser vivos, feitos de terra – produto de uma economia circular, consumindo seus próprios resíduos e refugos como qualquer ecossistema vivo”, escreve ele.
O papel da arquitetura na luta contra as mudanças climáticas vai além do controle das emissões dos edifícios ou do uso de materiais sustentáveis. Como Winston Churchill citou famosamente: “Nós moldamos nossos edifícios, depois eles nos moldam”. A arquitetura emoldura nossa forma de viver, nossas ações, nossa saúde e nossas relações sociais. Para estimular uma mudança nos valores sociais, torna-se vital mudar a arquitetura que determina nosso comportamento cotidiano.
A revolução verde verá uma mudança nas estruturas econômicas e sociais e, assim, influenciará o ambiente construído. A arquitetura ecológica não é um milagre único, mas um elemento em uma ampla gama de estratégias. Uma forma de arquitetura verdadeiramente verde pode e deve contribuir para o futuro paradigma da transição ambiental.